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sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Etnocentrismo X Relativismo Cultural (Processo de Adaptação a Uma Nova Realidade)

Antes de relatar sobre meu rolê insano pela Irlanda, considero importante falar um pouco sobre o processo de adaptação pelo qual eu passei. Espero que ajude.




Decidir sair do seu país de origem para se aventurar em outro continente, nao é nem de longe uma tarefa fácil. Voce irá lidar com culturas e sistemas completamente diferentes do seu, e vai ter que se adaptar.
Esse texto trata das dificuldades na adaptação por parte dos brasileiros, fenômeno que presenciei nos paises europeus onde morei e moro.
Vivi na Irlanda, Itália e agora vivo em Malta. Tive que me adaptar a sistemas completamente diferentes do meu, e diferentes também entre si. Por isso decidi explicar como estou conseguindo me adaptar através de um profundo aprendizado sobre mim mesma e sobre o lugar onde vivo.

O processo de adaptação requer calma.
 Precisei ter muita calma e respeitar o meu próprio tempo. Sim, cada um tem um tempo para processar uma nova cultura. O importante é estar aberto para isso. É atraves do contato com aquilo que é diferente que conseguimos identificar e compreender as nossas limitações. Compreendendo os seus limites, você irá perceber que alguns são flexíveis e outros não.  

Aprender a língua local.
Foi o primeiro passo e o mais importante no meu ponto de vista.  É vital aprender a língua falada no país e digo isso pois, por incrível que pareça, muitos brasileiros expatriados vivem há cinco ou dez anos inseridos em uma cultura diversa e se recusam a aprender a língua local. Como eles sobrevivem? Se relacionando somente com outros brasileiros, e trabalhando em subempregos onde eles podem se comunicar apenas com o básico da língua.

Modificar os hábitos alimentares.
Isso não quer dizer que aceitei todos os ingredientes que o país oferece. Tive oportunidade de provar e escolher ingredientes que fizeram e fazem parte da minha alimentação. Abri mao do arroz e feijão, da carne (muito cara na Europa), o famoso paio, etc. Abri mão da culinaria brasileira pois, além de ser dificil de encontrar os produtos, te pergunto: como você pode conhecer uma cultura sem estar de fato inserido nela? Precisei degustá-la, enfim, abraçar um novo estilo de vida. Vejo muitos brasileiros que ainda estão muito apegados aos produtos do nosso país e por isso pedem encomendas do Brasil ou viajam para outras cidade (caso da Irlanda) para conseguir tais produtos. Há casos de pessoas na Itália que levaram na bagagem quilos de feijão preto, paio (que saudade!) e linguiça. Estas foram pessoas que me disseram não conseguirem viver sem os produtos da culinária brasileira.
Se você nao consegue viver sem a culinaria brasileira, aconselho a não deixar o Brasil em hipótese alguma. Simples assim.
Estar apegado a sua própria cultura é oferecer resistência a novos desafios. Você limita suas experiências e sofre sem necessidade.


Compreender e aceitar o diferente.
Compreender que uma outra cultura é outra completamente diferente e aceitar as verdades alheias (realidades diferentes) foi o desafio que me exigiu maturidade e ainda hoje exige.  No início costumava comparar todos os hábitos, tradições, comportamentos com os do meu país. Sei que é inevitavel, tanto que faço isso até hoje. Mas entendo agora que comparar de uma maneira saudável é diferente de julgar. No início julguei muito mal o meu país. Sempre pensando que nós éramos atrasados e ignorantes demais como seres humanos, e mal educados como seres sociais.
Hoje penso apenas que somos atrasados historicamente, e que isso é natural visto que somos uma nação independente ainda muito nova. Somos diferentes.  Não pensem, como eu pensei no início, que os europeus são como “lords” ingleses que te reverenciam quando você passa na rua, respeitam seu espaço, ou pedem licença quando precisam passar. Isso é pura ilusão.  Logicamente cada país tem suas particularidades quando falamos em etiquetas sociais, mas tudo vai depender de pessoa para pessoa, de cada realidade. Já me deparei com irlandeses profundamente mal educados, assim como italianos muito bem educados por exemplo. Quem é melhor? Os italianos, os irlandeses, os malteses ou os brasileiros? Não existe melhor nem pior pois isso é apenas um jujgamento. Existe o diferente.    
O mais interessante nesse processo foi conseguir ser capaz de enxergar o Brasil de fora e, pela primeira vez na vida, experimentar um profundo sentimento de orgulho por ser brasileira. Os motivos são muitos.

Conhecer a legislação do país
Conhecer as leis do país de sua escolha antes de viajar vai facilitar muito a sua adaptação, pois você irá saber o que não deve fazer assim como quais são os seus direitos.  
Aprendi a importância dessa informacão após 2 anos morando fora, sendo que estou há quase três na estrada. Ou seja, demorou muito para a minha ficha cair.
Por exemplo, em Malta você nunca estará  seguro sem um contrato assinado. Aí você me pergunta: mas Tatiana, nao é assim que funciona em todos os lugares? Te respondo que não. Vou dar um exemplo prático. Se você procura um quarto para alugar em uma casa compartilhada na cidade de Galway - Irlanda (onde morei), você não vai precisar ter um contrato com o proprietário, pois este provavelmente já tem um assinado com o morador mais antigo. Isso significa que os irlandeses, em sua maioria, respeitam e muito as leis mesmo sem contratos firmados.
Isso acontece em Malta? Não. Em Malta, mesmo com contrato assinado e assinado por você e pelo proprietário, o cidadão vai tentar, na maioria dos casos, ferir o acordo firmado retendo o depósito que você pagou no primeiro mês. Mesmo constando no contrato, as leis em Malta não são respeitadas como deveriam ser, e isso é um aspécto cultural. Mas se acalme pois há como garantir os seus direitos. É só se manter o mais informado possível.

Por fim é importante termos em mente que estar inserido em uma nova cultura não significa necessariamente abdicar de suas raízes, ou substituir seu sentimento de pertencimento a cultura brasileira pelo sentimento de expatriado perdido no mundo. É apenas mergulhar naquilo que lhe é estranho para, enfim, promover o seu autoconhecimento.  Suas raízes serão as mesmas pois nossas origens, de onde viemos, é um fato imutável.

  


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